Gráfico detalhado mostrando retornos long-short em mercados bull e bear com linhas coloridas distintas

Existe um mundo fascinante por trás dos retornos dos fatores long-short em ações. Confesso que, quando comecei a aprofundar meu estudo sobre o tema, surpreendi-me com o quanto o investidor médio às vezes desconhece as armadilhas e as oportunidades escondidas entre os períodos de bull market e bear market. Vou compartilhar, de forma clara e com dados sólidos, o que aprendi sobre o poder, e o custo, do lado short para potencializar os retornos, especialmente quando tudo parece ruir.

Como fatores long-short geraram retornos consistentes

Muitos já ouviram falar nos clássicos fatores de ações: valor, lucratividade, investimento, momentum e tamanho. Por décadas, acadêmicos e profissionais testaram estratégias baseadas nesses fatores usando dados extensos, o famoso dataset do Kenneth French cobre impressionantes 58,5 anos, totalizando 702 meses, sendo 150 de bear market e 552 de bull market.

O resultado? Os fatores long-short construídos a partir dessas bases históricas apresentaram, em geral, retornos médios positivos com baixa correlação em relação ao mercado ou a outros ativos tradicionais. Na prática, isso quer dizer que estratégias multifatoriais conseguem, muitas vezes, amortecer quedas inesperadas de um ativo ou segmento específico.

Gráfico estilizado mostrando períodos de bull e bear markets divididos por cores distintas

Mas há um “porém”, a maioria dos investidores pessoa física, por motivos de regulação e operacional, só acessa o lado comprador (long-only) desses fatores, via ETFs ou fundos simplificados. Eu mesmo já vi pessoas se iludirem ao esperar retornos de bear market em produtos que não poderiam, por sua estrutura, capturar o real prêmio ali escondido.

O que são fatores? Uma breve explicação

Antes de mergulhar nas nuances, preciso contextualizar rapidamente os fatores que compõem as estratégias multifatoriais estudadas:

  • Mkt-RF (Market Minus Risk Free): O retorno do mercado em relação ao ativo livre de risco.
  • SMB (Small Minus Big): Desempenho de small caps versus big caps, o fator “tamanho”.
  • HML (High Minus Low): Valor, desempenho de ações de alto valor (low price-to-book) contra as de baixo valor.
  • RMW (Robust Minus Weak): Lucratividade, comparando empresas de alta e baixa lucratividade.
  • CMA (Conservative Minus Aggressive): Investimento, compara empresas que investem de forma conservadora versus as que investem de forma agressiva.
  • UMD (Up Minus Down): Momentum, compara ações vencedoras recentes contra perdedoras recentes.

Todas essas métricas são baseadas nos portfólios do Kenneth French, de construção elegante, mas por vezes abstrata para quem apenas conhecer ETFs de fatores no mercado brasileiro.

Retornos em bull e bear markets: como mudam os fatores?

Nos 58,5 anos analisados, o mercado passou cerca de 79% do tempo em bull market, e apenas 21% em bear market. Parece pouco, não?

Períodos de queda são raros, mas deixam marcas profundas nos fatores.

Quando examino como os fatores performaram em cada regime, percebo um paradoxo: os fatores de valor, lucratividade, investimento e momentum oferecem retornos médios significativamente superiores durante bear markets em comparação com bull markets. Em outras palavras, o prêmio fica mais suculento quando a maré vira e o otimismo desaparece!

A explicação não é óbvia. Pela teoria clássica, os prêmios de risco deveriam remunerar o investidor, principalmente, nos períodos de bonança, não nas crises. Mas os dados mostram outra realidade. O Valor Econômico ressalta que fundos long & short conseguem aproveitar justamente essa capacidade de capturar valor mesmo em momentos ruins, reforçando a intuição dos números.

O lado short: a grande fonte de retorno na crise

Ao separar os retornos das “pernas” long e short, vejo um padrão recorrente: os ganhos durante bear markets são quase inteiramente oriundos do lado short. Nas palavras simples: o investidor que só segura a ponta compradora praticamente não sente esses benefícios, e é por isso que ETFs de fatores raramente surpreendem em períodos de queda.

Homem olhando tela de computador com gráfico de ações em queda

Na prática, o short vende as ações “piores dentro dos critérios do fator”, seja a ação menos lucrativa, a mais cara, a mais agressiva em investimentos ou que perdeu mais valor recentemente. Essas apostas negativas disparam nos momentos de crash, muitas vezes porque “o mercado finalmente faz justiça” a esses papéis.

Isso fica claro em estratégias reais, como as do Invista Já, que promovem robôs investidores programados para se posicionar em ambos os lados de fatores, extraindo prêmios até onde o investidor físico raramente chega.

O caso do fator size (tamanho)

Só o fator tamanho foge dessa lógica: SMB entrega retorno positivo em bull markets, mas apresenta prejuízo médio em bear markets. Aqui, pequenos papéis sofrem mais quando tudo azeda, o prêmio é, sim, ligado ao risco de mercado, diferentemente do restante.

Como são construídos os portfólios neutros de fatores?

Penso que explicar a construção desses portfólios de forma simples pode ajudar a entender a mecânica do retorno separadamente em long e short.

A metodologia “2x3”, usada por Kenneth French, funciona assim: em cada fator, os papéis listados são divididos de acordo com tamanho (big, small) e o critério do fator (por exemplo, alto valor para HML ou alta lucratividade para RMW). Assim, formam-se portfólios, como:

  • Small High (ações pequenas e alto valor)
  • Big Low (ações grandes e baixo valor)

A média dos retornos dos grupos “bons” menos a média dos “ruins” resulta no fator. Para montar um portfólio neutro, compra-se uma cesta (long) e vende-se outra (short) com pesos equivalentes, dessa forma o portfólio fica imune à direcional do mercado.

Retornos long versus short: de onde vem realmente o prêmio?

Separando os resultados, vejo que:

  • Lado long: Costuma entregar retornos mais suaves, diversifyhando dentro do portfólio multifatorial. O Sharpe ratio por vezes é até maior, segundo Blitz, Baltussen e van Vliet.
  • Lado short: Praticamente todo o ganho em bear markets vem daqui. Porém, operar short na prática é caro, custos de aluguel e execução comem parte do retorno.
O short paga o prêmio gordo quando todos estão com medo.

Caso especial: momentum, crashes e custos de transação

Tenho uma relação de cautela com o fator momentum. Embora seja conhecido por altos retornos médios históricos, ele não tolera bem grandes reviravoltas. Crashes são frequentes, principalmente após crises como a financeira global ou outras reversões rápidas de tendência.

Já comentei sobre momentum em outra análise aqui.

E há ainda um ponto prático: custos de giro do portfólio. Como a estratégia troca mais os ativos, o prêmio na vida real é bem menor do que na planilha Excel. Um pequeno investidor sentiria isso rapidamente.

Small stocks: prêmio maior, custo maior

Não posso deixar de enfatizar: ações pequenas (small caps) apresentam prêmios superiores aos papéis grandes em estratégias de fatores, mas a diferença de custo de operação é igualmente relevante. Para quem pensa em replicar por conta própria, há mais obstáculos, liquidez limitada, maiores spreads, custos e riscos de execução acomodados.

Mesmo assim, quando o bear morde forte, o valor (value) dessas small stocks surpreende, como logo após a bolha dotcom. Curiosamente, retirar esse evento extremo da amostra não altera substancialmente a conclusão: o prêmio permanece superior em crises.

Gráfico de barras coloridas comparando retornos de small caps e big caps em diferentes mercados

Anomalia dos retornos em bear markets: duration e correção de distorções

Sempre achei intrigante que os fatores, na média, entregam mais retorno em bear markets, contrariando o que muita gente aprende em Economia. Há de se falar dos conceitos de duration, ações de valor, por exemplo, têm duration (prazo de maturação dos fluxos de caixa) menor do que ações de crescimento. Assim, quando o risco explode (bear market), as de valor sofrem menos e até se beneficiam do aumento brusco do prêmio de risco.

Outra hipótese que levo a sério: bear markets aceleram a correção de distorções de preço. Papéis sobrevalorizados caem rápido, enquanto empresas sólidas resistem mais, aplicando-se para quase todos os fatores, exceto tamanho.

Retornos dos fatores depois de 2004: uma mudança de regime?

Se eu olho para o pós-2004, percebo uma queda nos retornos dos fatores. Boa parte disso pode ser explicada pela quase ausência de bear markets nesse período mais recente. A raridade dos crashes torna menos frequente a reversão violenta, limitando a principal fonte de prêmio em fatores long-short tradicionais.

A importância de um bom backtesting se torna ainda maior nesse contexto, permitindo identificar quando o prêmio do fator parou de aparecer e ajustar o algoritmo conforme a nova realidade de mercado.

Decompondo retornos: o diferencial está (quase todo) na perna short

A análise dos dados mês a mês mostra: em todos os fatores, exceto tamanho, cerca de todo o diferencial de retorno em bear markets vem da perna short. O lado high (comprado) pouco se move, ou até perde modestamente —, enquanto o lado low (vendido) despenca, impulsionando o resultado total.

Parece, então, que a magia do multifatorial neutralizado (long-short puro, sem tendência direcional) está basicamente no timing dos bear markets, algo difícil de antecipar, mas muito poderoso quando acontece.

Nesse sentido, fundos quantitativos sofisticados, como os do Invista Já, podem fazer diferença, justamente por automatizar a execução e gestão do risco dessas estratégias. O investidor tradicional, limitado ao lado long, terá experiência muito diferente, quase nunca sentindo o mesmo impacto positivo dos bear markets.

Robôs de algotrading operando gráficos financeiros com touro e urso ao fundo

Como as correlações entre fatores mudam nas quedas?

Outro aprendizado pessoal está na análise de correlação dos fatores:

  • Em tempos normais: Fatores value, lucratividade, investimento e momentum têm correlação baixa entre si, oferecendo diversificação real.
  • Durante bear markets: As correlações aumentam bastante e passam a ser negativas em relação ao mercado em geral, todos “apontam na mesma direção”. A diversificação se dilui.

A decomposição revela mais:

  • Lado long: Correlação baixa entre si e quase nula na negativa com o mercado. Mantém alguma diversificação.
  • Lado short: Correlação alta entre fatores e correlação fortemente negativa com o mercado. Na parte ruim do ciclo, eles caem juntos! O risco sistemático reina.

O lado long-only: metade do prêmio com menos dor de cabeça

Talvez o ponto mais relevante para o investidor comum, inclusive eu, quando não estou operando algoritmicamente no Invista Já, seja que as estratégias long-only, embora capturem apenas parte do prêmio multifatorial, são acessíveis, fáceis de manter e menos custosas.

Segundo Blitz, Baltussen e van Vliet, o Sharpe ratio dos fatores geralmente é mais alto do lado long e produtos simples captam até metade do prêmio total. Isso sem a zona cinzenta de custos, taxas e dificuldades operacionais do short para o investidor pessoa física.

Por fim, a pesquisa da SciELO Brasil mostrou que os ETFs reagem de maneira diferente a eventos extremos, e estratégias de reversão tendem a performar melhor em determinados meses ou até em situações fiscais específicas, mais um lembrete de que, na vida real, a execução importa tanto quanto o modelo matemático.

Então, como eu aplico esse conhecimento?

Quando monto ou ajusto uma estratégia de algoritmo de fatores, seja no Invista Já ou pessoalmente —, minha principal preocupação é: qual parte dos retornos realmente consigo acessar? Posso ou não operar o lado short com eficiência? A história completa dos fatores só se revela quando se observa ambos os lados do trade, inclusive em diferentes regimes de mercado.

O gerenciamento de risco aparece como o outro lado da moeda: quanto coragem (e quanto recurso operacional) estou disposto a empregar em posições vendidas? Essa resposta pode ser decisiva para o sucesso, ou a frustração.

Erros comuns ao interpretar retornos multifatoriais

No meu contato com investidores que usam, por exemplo, ETFs de fatores, vejo alguns equívocos recorrentes:

  1. Esperar grandes ganhos em crises operando apenas o lado long;
  2. Desconsiderar os custos e riscos reais de manter posições short;
  3. Ignorar que o market timing ainda prevalece no curto prazo, e bear markets são imprevisíveis;
  4. Subestimar que fatores passam a andar juntos justamente nos piores momentos, reduzindo a diversificação;
  5. Não avaliar periodicamente a eficiência dos fatores após períodos longos sem crises (como aconteceu depois de 2004).

Conclusão: O que fazer com isso?

É inevitável: para quem busca segurança nos períodos de queda do mercado, a magia dos fatores multifatoriais está, sobretudo, na perna short, a parte menos acessível ao investidor pessoa física. Estratégias long-only entregam metade do prêmio, mas oferecem paz de espírito e simplicidade operacional que o longo prazo costuma recompensar.

Sim, bear markets acontecem menos, mas moldam profundamente os retornos dos fatores. Saber disso evita frustrações e escolhas erradas na hora de montar carteiras sofisticadas, seja manualmente, ou usando plataformas quantitativas como o Invista Já. Se você ficou curioso sobre como robôs multifatoriais ou estratégias de algotrading podem transformar seu jeito de investir, sugiro conhecer mais sobre nosso trabalho ou explorar em detalhes a análise quantitativa aplicada ao mercado financeiro. A performance do seu portfólio, e seu sono, podem agradecer.

Perguntas frequentes

O que é uma estratégia long-short?

Em linhas simples, uma estratégia long-short consiste em comprar ativos considerados “melhores” (long) ao mesmo tempo em que se vende ativos “piores” (short), de acordo com certos critérios, como valor ou momentum. O objetivo é obter ganhos independentemente da direção do mercado, focando na diferença de performance entre as duas pontas.

Como funciona o retorno em mercados bear?

Durante bear markets, os retornos dos fatores tradicionais se concentram principalmente na perna short. Ou seja, é ao apostar contra ativos ruins que a maior parte do prêmio aparece. A ponta long, nesses momentos, não gera grandes resultados e pode até perder. O efeito positivo do fator só aparece para quem consegue executar a estratégia completa, algo natural em fundos quantitativos e difícil para o investidor físico comum.

Vale a pena fazer short em ações?

Fazer short pode aumentar o potencial de retorno, especialmente em mercados de queda. Porém, há custos de aluguel, execução e necessidade de monitoramento constante. Para pessoas físicas, pode não ser prático, caro e arriscado. Quem deseja proteção parcial ou simplicidade, o lado long dos fatores já entrega parte do benefício sem essas dificuldades.

Quais são os principais riscos do short?

Os riscos do short são específicos e, às vezes, subestimados: risco ilimitado de alta, custos constantes de aluguel do ativo, possibilidade de chamada de margem e dificuldades operacionais, especialmente em papéis pouco líquidos. O rendimento pode ser alto nos momentos certos, mas o risco estrutural é muito maior que o lado long-only.

Como escolher fatores para long-short?

Escolher fatores exige estudo histórico, compreensão dos ciclos de bull e bear market, boa gestão de risco e avaliação dos custos operacionais. O investidor deve analisar quais fatores mantêm desempenho consistente em diferentes regimes, checar a liquidez dos ativos envolvidos e preferir fatores com baixa correlação entre si. Para quem tem restrições técnicas, considerar uma abordagem long-only pode ser o melhor caminho inicial, a diversificação já traz boa parte do benefício esperado.

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Flavio Araújo

Sobre o Autor

Flavio Araújo

Com mais de 10 anos de experiência no Mercado Financeiro e 6 anos de especialização em algotrading, uno minha formação em Engenharia e MBA em Mercado de Capitais para cumprir um objetivo claro: democratizar o acesso à matemática e tecnologia de ponta para traders brasileiros. Interessado em levar suas operações para o próximo nível? Entre em contato pelo WhatsApp para conversarmos.

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