Se existe uma verdade que atravessa o tempo nos investimentos é a busca por diversificação real. Só que “diversificar” não significa só somar ativos diferentes numa carteira. O segredo está, de fato, em entender e medir como esses ativos se comportam uns em relação aos outros, principalmente quando pensamos em horizontes longos. Quero te mostrar por que olhar para a correlação dos ativos é basicamente o que define o benefício (ou não) de diversificar seu portfólio. E, aqui entre nós, medir só o curto prazo pode enganar, e muito.
O conceito de correlação: o passo além da simples variedade
Você provavelmente já ouviu: “não coloque todos os ovos na mesma cesta”. Só que, ao escolher as cestas, não adianta escolher três iguais, ainda que estejam em lugares diferentes. Se suas cestas reagem igual a crises, a eventos macroeconômicos e a oscilações globais, você está exposto ao mesmo risco em dose tripla.
A correlação mede exatamente isso. Como um ativo “anda” junto com o outro. Se a correlação é 1, eles sempre se movem do mesmo jeito; se é 0, não têm ligação nenhuma; se é negativa, se mexem em direções opostas. Mas, e se eu te disser que essa ligação muda, e muito, conforme ampliamos o horizonte de análise? Essa é a essência da verdadeira diversificação.
Correlação de curto ou de longo prazo? A diferença muda tudo
No meu trabalho diário, vejo muitos investidores, e até gente do mercado, baseando decisões olhando apenas para as correlações de curto prazo, como a dos retornos mensais ou anuais. É cômodo, já que esses números estão nos filtros dos principais sites financeiros. Só que aí mora o perigo.
Medir correlação só no curto prazo pode esconder oportunidades de ouro.
Um estudo marcante (usando os dados do Kenneth French data library) mostra algo pouco divulgado: enquanto a média da correlação mensal entre mercados de ações internacionais está perto de 0,7, no horizonte de cinco a dez anos ela cai para a faixa de 0,5 a 0,3. Ou seja, ativos que pareciam muito ligados no curto prazo, no longo prazo quase perdem essa conexão.

Essa virada tem dois efeitos diretos:
- Reduz a volatilidade de portfólios diversificados internacionalmente
- Aumenta o Sharpe ratio da carteira global, mais do que o esperado olhando só prazos curtos
Por exemplo, no período de julho de 1990 a março de 2024, a volatilidade de um portfólio igualmente ponderado com ações globais cai muito à medida que o prazo de apuração do retorno aumenta. O Sharpe ratio, que era menor que 0,4 no mensal, salta para mais de 0,6 em dez anos. Para o investidor com foco de longo prazo, o resultado positivo é bem mais forte do que parece à primeira vista. E poucos sabem disso.
Os dados e as regiões: América do Norte, Ásia e emergentes sob a lente da correlação
Quando olho para as principais regiões, usando as definições do Kenneth French data library —, temos:
- América do Norte: EUA e Canadá
- Ásia-Pacífico desenvolvido (excluindo Japão): Austrália, Hong Kong, Nova Zelândia e Singapura
- Japão: separado, dada sua relevância histórica e econômica
- Emergentes: economias em desenvolvimento de diversos continentes
O fascinante é enxergar como mercados asiáticos (exceto Japão) e emergentes seguem muito próximos ao longo do tempo, com correlações que se mantêm altas, muitas vezes acima de 0,7 no curto e perto de 0,5-0,6 até em 10 anos. Dificilmente é só coincidência. Provavelmente, há influência de fatores como exportação e consumo global de commodities.
Essa hipótese fica mais forte quando noto que a ligação entre mercados asiáticos/emergentes e a indústria de petróleo dos EUA ronda 0,5 em todos os prazos. Já América do Norte e Japão mostram exatamente o oposto: sua correlação com petróleo vai caindo ao longo do prazo analisado e até fica negativa depois de cinco anos. Isso sugere o efeito dos fundamentos econômicos locais se impondo no longo prazo, como estrutura produtiva, dependência energética e políticas internas.

Se você busca mais detalhes sobre as diferenças entre mercados e como a modelagem quantitativa pode ajudar na diversificação, recomendo o artigo sobre análise quantitativa do Invista Já, onde aprofundo essa conversa usando outros exemplos.
Por que os fundamentos dominam no longo prazo?
Um dos estudos que mais mudaram meu olhar sobre diversificação é o de Asness, Israelov & Liew (2011). Eles mostram, de forma direta, que no curto prazo, variações de múltiplos de preço (“valuation”) explicam a maior parte da volatilidade. Em um horizonte longo, porém, quem manda são os fundamentos reais: crescimento, lucros, produtividade da economia local.
Esse efeito faz as correlações descerem no tempo. Cada país ou setor passa a andar pelas próprias pernas e os ciclos locais se sobrepõem às oscilações globais.
Essa queda de correlação também faz o otimizador de portfólio atribuir pesos menos concentrados, criando uma carteira mais saudável e robusta diante de mudanças inesperadas. Até escrevi sobre como simulações de Monte Carlo podem ajudar a visualizar essa robustez numa discussão recente.
Setores que fazem a diferença: recursos naturais e muito mais
Navegando por dados dos EUA (em especial o estudo de White & Grantham 2016), percebi que muitos setores tidos como “arriscados” são, na verdade, ótimos agentes de diversificação quando agregados a um portfólio (“beta” baixo e correlação baixíssima no longo prazo).
- Setores como carvão, ouro, minas, petróleo, navios, fumo, agricultura e saúde apresentaram correlações menores que 0,25 em janelas de dez anos com o mercado amplo dos EUA; alguns deles até negativas (exemplo: carvão e ouro chegam próximos a -0,2).
- Seus betas, ou seja, o quanto reagem à variação do mercado, divergem radicalmente: vão de menos de 0,5 até -2.
Um ponto que sempre me chama atenção é que, com o passar dos anos, não só a correlação desses setores com o mercado cai, como a volatilidade anualizada do próprio portfólio também despenca. Resultado: o Sharpe ratio (retorno/risco) de uma carteira que mistura esses setores de beta baixo com o mercado mais que dobra em dez anos.
Ah, e curiosamente, ativos de recursos naturais costumam se sair historicamente bem em ambientes de inflação global alta, algo importante para períodos de instabilidade econômica.

Fundos imobiliários (REITs): comportamento surpreendente no longo prazo
Muita gente acredita que fundos imobiliários (REITs) dependem totalmente do movimento do mercado acionário. Contudo, analisando o índice FTSE Nareit All Equity REITs de janeiro de 1972 a março de 2024, fica claro que a correlação, inicialmente alta com ações, despenca fortemente conforme o horizonte se alonga.
Já a ligação dos REITs com imóveis diretos, ao contrário, vai subindo. O mais interessante é o efeito prático: a volatilidade anualizada dos REITs e do portfólio misto REITs+ações cai drasticamente em horizontes longos, e o Sharpe ratio sobe de modo acentuado. Na prática, é como se houvesse um freio natural aos sustos do mercado.
Esse fenômeno tem tudo a ver com fundamentos “imobiliários” (aluguéis, demanda regional, tendências populacionais) que, no longo prazo, se impõem sobre o “ruído” do mercado financeiro global.
Por que o longo prazo muda tanta coisa?
Tem quem olhe para essas evidências e diga: “mas se a história se repetir”. Admito: o período entre 1990 e 2024 beneficiou carteiras com emergentes e recursos naturais, porque tivemos a “década perdida” dos EUA e alta forte das commodities nos anos 2000. Mas não é só isso. Trabalhos acadêmicos analisando séculos de dados confirmam que a diversificação internacional e setorial só fica clara nos horizontes longos.
Investir pensando só no próximo ano limita as possibilidades de maximizar retorno ajustado ao risco.
Se você se interessa em testar na prática essa mudança no perfil de risco-retorno usando algoritmos, recomendo o texto do Invista Já sobre backtesting de estratégias. Entender como estratégias reagem em diferentes prazos é fundamental para evitar erros e vieses.
O efeito prático: otimizando portfólios com correlações longas
Na hora de usar um otimizador de portfólio, seja para rebalanceamento manual ou num robô como os do Invista Já, misturar ativos com baixa correlação em janelas longas (ações internacionais, recursos naturais, REITs) muda completamente os pesos sugeridos na carteira.
Isso já foi explorado até mesmo para portfólios brasileiros, como no estudo da FGV sobre inclusão de criptomoedas em portfólios diversificados. O resultado padrão: independentemente do método (ponderação igualitária, por volatilidade ou média-variança), a inclusão de ativos pouco correlacionados turbina o Sharpe ratio.
Isso vale para métodos clássicos (cash-flow matching, lógica fuzzy, entre outros) e até para estratégias baseadas em momentum (FGV). Os ganhos vêm do mesmo princípio: os ativos mais “independentes” formam juntos uma carteira menos frágil a choques inesperados.
Rebalancear: igual, por valor de mercado ou outra regra?
Uma dúvida comum (e pertinente) é sobre a frequência e a regra de rebalanceamento. Em minhas leituras, e em incontáveis simulações feitas no Invista Já, notei que:
- Portfólios igualmente ponderados tendem a capturar melhor o benefício da descorrelação se rebalanceados com frequência moderada (anual ou semestral)
- Portfólios por valor de mercado podem ficar concentrados quando há bolhas ou crises regionais, reduzindo o benefício de diversificação
- - Na prática, mesmo rebalanceando mensalmente, boa parte do benefício permanece, principalmente se a seleção de ativos considerar as correlações de longo prazo
Vale ponderar os custos: rebalanceamento mais frequente implica mais negociações e taxas. Mas, para quem investe em índices ou ETFs, esse efeito é minimizado.

É importante lembrar que o cenário global mudou com empresas buscando a melhor bolsa para listar (cross listing), mas fundamentos locais ainda são dominantes, especialmente em empresas médias e pequenas. Isso traz resiliência à descorrelação.
Limitações: quando a correlação longa pode não ajudar?
Como toda ideia “boa demais”, usar correlações longas também tem limites. Vi alguns pontos em backtests e pesquisas nos próprios robôs do Invista Já:
- Alavancagem de curto prazo perde sentido: se você opera com alavancagem diária ou semanal, importar pouco a correlação em janelas de dez anos
- Necessidade de liquidez constante: alguns ativos, como recursos naturais e mercados emergentes, sofrem choques de liquidez em crises
- Período amostral influencia no resultado (exemplo notório: décadas com valorização concentrada em poucos setores ou países)
Mesmo assim, vejo um padrão: quando o investidor pensa e investe no horizonte da própria aposentadoria, a descorrelação é amiga fiel. E rebalancear próximo da janela que minimiza a correlação tende a ser muito interessante, embora os ganhos básicos da diversificação apareçam mesmo com rebalanceamento mensal.
Para quem deseja aprofundar no controle de risco, também sugiro nosso texto sobre gerenciamento de risco em algotrading.
Conclusão: Diversifique “olhando o tempo” por trás dos números
Ao longo desse texto, tentei mostrar que o maior benefício da diversificação está ligado à descorrelação real, e não apenas à variedade de ativos. O tempo é o fator mais negligenciado nisso. Quando olhamos para prazos longos, as correlações caem e a composição esperta da carteira traz vantagens que os números de curto prazo nunca mostrariam.
A verdadeira diversificação se revela para quem tem paciência de olhar além do próximo ciclo.
Se você gostou dessas ideias e quer experimentar robôs capazes de usar dados reais de longo prazo na montagem e rebalanceamento de portfólios, conheça o Invista Já. Nossa missão é tornar as estratégias de algotrading, antes exclusivas de fundos sofisticados, acessíveis a qualquer investidor que queira de fato fazer escolhas baseadas em ciência e dados, não em modismos ou intuição.
Aproveite, teste nossos serviços, leia outros artigos sobre risco, drawdown e descubra como a matemática, quando usada com inteligência, pode ser sua aliada de longo prazo.
Perguntas frequentes sobre diversificação e correlação
O que é diversificação de portfólio?
Diversificação de portfólio é a prática de investir em diferentes tipos de ativos, setores ou regiões para reduzir o risco geral. Isso significa que, se um investimento vai mal, outros podem compensar as perdas. O objetivo é evitar que todo o portfólio sofra com um único evento negativo. Ao diversificar com critérios corretos de correlação de longo prazo, o investidor consegue suavizar variações e buscar melhores resultados ajustados ao risco.
Como funciona a correlação entre ativos?
Correlação entre ativos mede o quanto dois investimentos se movem juntos em termos de retorno. Se a correlação é 1, eles andam exatamente juntos; se for –1, quando um sobe o outro cai. Se for zero, não há relação. Conforme o prazo da análise aumenta, essa correlação pode mudar bastante, e é esse comportamento que gera o maior benefício para quem pensa o portfólio no longo prazo.
Por que diversificar melhora os investimentos?
Ao diversificar, diminuímos a exposição a riscos específicos de um setor, empresa ou mercado. Se um ativo sofre perdas, outros pouco correlacionados podem segurar o resultado da carteira, diminuindo a volatilidade e aumentando a chance de retornos mais estáveis ao longo do tempo. Estudos mostram que essa estratégia aumenta o Sharpe ratio e que os efeitos são potencializados quando ativos pouco correlacionados são escolhidos, principalmente pensando a longo prazo.
Quais ativos são mais recomendados para diversificar?
Os ativos recomendados para diversificar variam de acordo com o perfil do investidor, mas misturar ações (de diferentes países, setores e tamanhos), fundos imobiliários (REITs), commodities (ouro, petróleo) e até criptomoedas pode aumentar a descorrelação na carteira.Segundo estudos recentes, a inclusão de ativos pouco correlacionados multiplica o benefício para o investidor de longo prazo.
Como saber se meu portfólio está diversificado?
Para saber se seu portfólio está realmente diversificado, vá além de contar quantos ativos possui. Analise se eles pertencem a setores e regiões diferentes e verifique a correlação entre eles, especialmente em janelas longas, como 5 ou 10 anos. Ferramentas quantitativas, planilhas e robôs do Invista Já podem ajudar a medir esse dado com precisão e sugerir ajustes que tornem a carteira mais robusta diante de choques inesperados.
