Recentemente, um antigo debate voltou com força nos círculos de finanças pessoais: faz sentido para quem tem horizonte de longo prazo investir 100% em ações para a aposentadoria? Ou seria melhor apostar num portfólio 60/40 – com 60% em ações e 40% em títulos – e, caso queira um risco equivalente ao das ações, usar alavancagem para chegar lá? Quando li um artigo defendendo a primeira opção, logo recordei do que dizem a boa teoria financeira e o que a própria história mostra. Eu mesmo já refleti muito sobre esse tema, tanto profissionalmente quanto na minha vida de investidor. Se existe um consenso bem fundamentado, talvez seja este: busque o melhor Sharpe ratio possível e só depois ajuste o risco ao nível que você suporta, seja alavancando ou não.
O que o debate recente reacendeu
Confesso que senti um certo déjà vu ao ver tantos defensores da carteira 100% ações nas discussões atuais. Eles argumentam que, como ações tendem a render mais no longo prazo, a estratégia seria “só comprar e esquecer”. Mas será mesmo que abrir mão da diversificação faz sentido? Eu duvido. E não estou sozinho. Pesquisadores como Cliff Asness e Jeremy Schwartz já testaram essa ideia em décadas de dados, com conclusões bem diferentes. Seus estudos, aliás, se tornaram uma referência para mim e para projetos dedicados a algotrading, como o Invista Já, que procuram traduzir esses conceitos da teoria quantitativa para práticas de portfólio mais inteligentes.
Diversificar é aumentar liberdade sem abrir mão de retorno.
Como a teoria financeira enxerga o problema
A teoria do portfólio tradicional, aquela de Harry Markowitz que aparece em todo livro-texto de finanças, propõe um raciocínio simples: primeiro busque a carteira que oferece o maior Sharpe, depois ajuste a volatilidade ao seu perfil via alavancagem (ou redução de exposição). O Sharpe ratio, para quem não se lembra, mede o retorno excedente (acima do ativo livre de risco), ajustado pelo risco tomado. O investidor racional não se apaixona por um ativo apenas. Ele monta uma combinação de ativos que juntos entregam mais retorno para cada unidade de risco.
Nessa linha, o portfólio 60/40 ganhou fama. Mas sempre que alguém sugere usar alavancagem para igualar a volatilidade dos portfólios (por exemplo, trazendo o 60/40 ao mesmo nível de risco do 100% ações), surge a pergunta: há ganho real ou é só uma ilusão estatística?

O segredo: Sharpe ratio e diversificação
Imagine uma carteira com Sharpe ratio superior à das ações sozinhas. É possível? Historicamente, sim. E é aí que a diversificação brilha. Ao combinar ativos descorrelacionados, como ações e títulos, é comum que a carteira resultante tenha Sharpe superior ao dos dois ativos isolados. Isso acontece porque os momentos de queda dos ativos não coincidem perfeitamente, suavizando perdas e tornando o caminho do investidor menos traumático.
- Sharpe de ações historicamente nos EUA: cerca de 0,4 a 0,5
- Sharpe de títulos: 0,2 a 0,3
- Sharpe do portfólio 60/40: normalmente entre 0,5 e 0,6
Se traçarmos a linha, a diferença entre portfólios com igual volatilidade depende basicamente do diferencial de Sharpe. Ou seja, ao longo do tempo, o ganho marginal de aumentar exposição a ativos arriscados cai e segue uma linha que reflete a diferença dos Sharpes entre as carteiras. Se o 60/40 tem um Sharpe maior, ele ganha no ajuste fino.
Mean geometric excess return: explicando o conceito
E aqui entra um conceito técnico que vale a pena conhecer: o mean geometric excess return (média geométrica do retorno excedente). Não é só um nome complicado. É, basicamente, a forma correta de medir retorno ajustado pelo efeito negativo da volatilidade no resultado composto ao longo do tempo.
A fórmula para estimar esse retorno médio é:
Rg ≈ rm - (σ²)/2
Onde rg é o retorno geométrico médio, rm o retorno médio aritmético, e σ a volatilidade. Ao igualar a volatilidade das carteiras (com alavancagem ou não), a diferença média de desempenho esperado se resume a:
Sharpe diferencial × volatilidade
Simples assim. Mas com efeito gigante ao longo do tempo.
O que mostram os dados históricos?
Busquei dados de mais de 90 anos para conferir se, na prática, a teoria se confirma. Estudos como o de Jeremy Schwartz e Cliff Asness (publicado no Investing.com) fazem exatamente essa comparação. Entre janeiro de 2000 e dezembro de 2023, por exemplo, investir em um portfólio 60% ações (S&P 500) e 40% em títulos (U.S. Agg) trouxe retorno anual de 6,5%, contra 7% da carteira só de ações. Mas... o 60/40 teve volatilidade, drawdowns (quedas máximas) e estresse bem menores.
- 60/40 alavancado à mesma volatilidade das ações: cerca de 0,8 ponto percentual a mais ao ano versus só ações, em mais de dois terços dos períodos de dez anos analisados.
- Pior fase: crise inflacionária dos anos 1980 (bonds sofreram muito)
- Melhor fase: década de 1990 e pós-2008, com queda forte dos juros
Se olharmos os “picos do pânico”:
- Máxima queda nas ações: -83%
- Máxima queda no 60/40 alavancado (100% da volatilidade das ações): -82%
- Máxima queda em bonds alavancados: -75%
No entanto, as quedas médias e o comportamento ao longo de décadas favorecem o 60/40 alavancado. Ele “sofre menos” nos períodos de baixa, exceto em eventos muitos raros, como ondas longas de inflação ou quando a correlação entre ativos dispara repentinamente.

Sobre drawdowns: fórmulas, médias e extremos
Drawdown não é só um número frio. Uma sequência de grandes quedas pode inviabilizar sonhos e até zerar uma carteira alavancada demais. Os principais métodos para medir isso usam a relação entre volatilidade, Sharpe e o tipo de drawdown:
- Esperado (mean drawdown): aproxima-se de uma função da volatilidade e do Sharpe;
- Máximo observado: muito afetado por caudas de distribuição e fatores raros (black swans);
- Tempo de recuperação (recovery period): geralmente menor quando a distribuição de perdas é mais suave.
No 60/40 alavancado, as quedas médias e máximas tendem a ser menos erráticas do que no 100% ações – a menos que a autocorrelação das séries aumente muito, o que pode acontecer em crises de liquidez ou pânicos sistêmicos, e isso costuma penalizar mais os portfólios balanceados.
No artigo sobre drawdown no Invista Já você encontra um passo a passo de como medir, analisar e ponderar esses riscos antes de decidir ampliar o risco com alavancagem.
Limitações teóricas e práticas do 60/40 alavancado
Aqui começa a parte menos falada pelos fãs do 60/40. As fórmulas perfeitas não resistem a grandes níveis de alavancagem na vida real. Não há rebalanceamento infinito, nem retornos contínuos. Na prática, se a carteira estiver muito alavancada e rebalanceada mensalmente, uma queda isolada pode literalmente zerar o portfólio antes do investidor ter chance de reagir, principalmente se o “crash” vier logo depois de um rebalanceamento que aumentou a posição em ativos que despencaram.
Eu já presenciei na prática como essa limitação “vem forte” em períodos voláteis. Quem trabalha com estratégias quantitativas, como as do Invista Já, sabe medir a diferença entre o ideal matemático e o real. Afinal, a alavancagem traz crescimento quando bem usada, mas acelera a destruição se mal calibrada. Por isso, um robusto gerenciamento de risco em algotrading é indispensável.
Se quiser entender como abordo as limitações e pitfalls de estratégias alavancadas nos meus estudos, recomendo consultar o conteúdo sobre risk management em algotrading, que detalha métodos quantitativos para cauda de risco e limites de exposição.

Custos de alavancagem e inflação: quando o sonho vira pesadelo
Talvez o ponto menos intuitivo para o investidor comum seja: qualquer custo de alavancagem acima do juro livre de risco elimina rápido a vantagem matemática do 60/40 alavancado. E isso não é raro no mundo real.
- Investidores institucionais (fundos, fundos de pensão, grandes gestores) têm acesso a taxas próximas do juro básico (overnight), tornando a estratégia de alavancagem realista.
- Pessoas físicas quase sempre pagam spreads altos para conseguir alavancagem, seja via futuros, seja via financiamento de margem, praticamente pulverizando a vantagem potencial do 60/40 alavancado.
Outra limitação prática (e igualmente dolorosa) é a inflação. Em períodos inflacionários longos, os títulos de renda fixa (bonds) sofrem, e o portfólio 60/40 perde sua “almofada” de diversificação mesmo com rebalanceamento mensal. O que ajuda nestas horas é a flexibilidade da parte dos bonds – usar títulos indexados à inflação pode mitigar esse risco.
Mas mesmo nesse cenário, o efeito long run do rebalanceamento suaviza um pouco o aumento da correlação entre ações e títulos.
A composição dos 40: bonds ou caixa?
Quando penso em longos horizontes, a escolha de qual ativo serve como “almofada” no portfólio me parece fundamental. Trocar bonds por caixa? Testes mostram que a diversificação real desaparece, porque o Sharpe da carteira cai bastante. Bonds funcionam como “seguro” não só ao render, mas por carregar risco descorrelacionado das ações, enquanto o caixa, no máximo, reduz o risco total sem adicionar potencial de retorno.
É fácil cair na armadilha de não olhar com atenção os parâmetros de risco e retorno futuros. Quanto maior a incerteza ex-ante desses parâmetros, menor deve ser a alavancagem na minha opinião. Aliás, é por isso que defendo uma abordagem probabilística, baseada em simulações históricas e testes robustos, como as técnicas de Monte Carlo que abordo em simulações de portfólio do Invista Já.

O papel do algotrading e a busca por portfólios ótimos
A chegada do algotrading democratizou o acesso a estratégias eficientes e regradas. Eu acredito fortemente que um investidor equipado com robôs, como os ofertados pelo Invista Já, tem vantagem em construir portfólios que buscam o melhor Sharpe, monitorar riscos e rebalancear de forma mais disciplinada, deixando o emocional de lado. Explico essa ideia em detalhes no guia prático sobre algotrading.
Essas ferramentas tornam a tarefa de ajustar exposição, medir drawdowns e fazer rebalanceamentos algo mais científico e menos intuitivo. E, nem sempre, humanos conseguem vencer as próprias limitações cognitivas diante de crises.
Quer entender mais sobre fundamentos?
Se o tema de fundamentos quantitativos do mercado financeiro te interessa (e, honestamente, eu acho que deveria interessar), aprofunde-se em tópicos como fórmulas de volatilidade, correlação, simulação de cenários, cauda de risco, margens de erro de portfólios. Tem um resumo disso no post de fundamentos do Invista Já, porque só com bons alicerces teóricos fica confortável tomar decisões complexas.
Conclusão: qual caminho tomar?
Para quem tem horizonte longo e acesso a custos justos de alavancagem, diversificar amplia o Sharpe e permite ajustes de risco mais seguros e racionais. É muito difícil (eu diria praticamente impossível) justificar uma carteira só de ações pura para alguém que pode e sabe alavancar com responsabilidade. O melhor caminho, na minha opinião, é sempre buscar o portfólio com maior Sharpe possível – depois, ajustar o risco ao perfil desejado, seja alavancando ou reduzindo exposição.
Aliás, a história mostra, com números robustos, que o 60/40 alavancado costuma entregar retorno superior ao portfólio só de ações, com menor risco médio e quedas médias também menores. Quando há dúvidas sobre o que está por vir, proteger-se pela diversificação e um pouco menos de alavancagem pode ser prudente.
Se quer investir como um profissional, entendendo o real valor de cada unidade de risco tomada, recomendo conhecer melhor o Invista Já. Nossa missão é traduzir a matemática e a tecnologia de ponta em robôs e estratégias algorítmicas acessíveis, sempre focando em performance, segurança e inteligência. Siga-nos, leia os conteúdos recomendados e venha construir um portfólio para o século XXI!
Perguntas frequentes
O que é um portfólio 60/40 alavancado?
Um portfólio 60/40 alavancado é uma carteira que investe 60% do capital em ações e 40% em títulos de renda fixa (bonds), mas usando alavancagem para elevar a volatilidade ao nível de uma carteira composta apenas por ações. Isso significa tomar emprestado (direta ou indiretamente) para comprar mais desses ativos, buscando aproveitar o benefício da diversificação, mantendo o mesmo risco total (medido pela volatilidade) que se teria apenas em ações. Ao “turbinar” a exposição dessa forma, espera-se potencializar o retorno ajustado ao risco.
Vale a pena investir em ações puras?
Embora ações puras possam parecer atraentes pelo histórico de retornos altos, a ausência de diversificação torna o risco maior e expõe o investidor a quedas mais profundas e demoradas. Para quem tem acesso a alavancagem sensata, a teoria e os dados históricos mostram que uma carteira diversificada, especialmente o 60/40 alavancado, entrega retorno médio melhor com menor sofrimento nos piores períodos. Mas quem não dispõe de alavancagem, pode ainda considerar o 60/40 tradicional para diluir sustos.
Como funciona a alavancagem em portfólios?
Alavancar um portfólio significa tomar recursos emprestados para aumentar a exposição ao mercado. No contexto do 60/40, alavancagem permite que se compre uma quantidade maior de ativos sem aumentar, proporcionalmente, o capital próprio investido, equalizando o risco da carteira ao de um portfólio 100% ações. Esse processo pode ser feito por meio de derivativos, contratos futuros ou operações de crédito. É fundamental considerar custos, riscos de liquidação e a necessidade de rebalanceamento frequente para evitar violações de limites impostas por quedas acentuadas.
Quais os riscos do portfólio 60/40 alavancado?
Os principais riscos são:
- Possibilidade de perdas severas (drawdowns) em eventos extremos, especialmente se a alavancagem for muito alta.
- Risco de liquidação, caso uma queda abrupta reduza o capital de maneira muito rápida.
- Riscos ligados à inflação, que pode corroer o valor dos títulos.
- Elevação dos custos de alavancagem acima do retorno dos ativos pode zerar o benefício esperado.
- Dependência de rebalanceamento preciso – um erro pode amplificar prejuízos.
O que a história mostra sobre esses investimentos?
Estudos de longo prazo indicam que o portfólio 60/40 alavancado, ajustado para ter a mesma volatilidade do portfólio só de ações, geralmente supera em retorno médio anual e apresenta quedas médias menores. Exceções ocorreram em períodos de inflação exagerada, mas em mais de dois terços dos intervalos de dez anos, o 60/40 alavancado ficou à frente. O segredo está na diversificação, no rebalanceamento disciplinado e no uso ponderado da alavancagem. Porém, o contexto de custos e perfil do investidor deve sempre ser considerado.
